24 de set. de 2008

PARTE I: O Papo do Patife

Pensamentos despenteados para dias de vendaval.

“Aquele que sai vencedor de uma discussão deve-o, muitas vezes, não tanto à veracidade dos juízos expostos em suas proposições, quanto à astúcia e à destreza com que os defende.” (Arthur Schopenhauer)
Por Neilton Lima*
Professor, pedagogo e pós-graduando em psicopedagogia.

A razão pode dar golpes sujos. A patifaria intelectual faz uso e abuso da inteligência e das palavras. Em vez de procurar a verdade, o adversário quer destruir seu oponente. A arte de discutir transforma-se na luta sem escrúpulos para confundir com desvios. Uma coisa é querer persuadir alguém de nossas convicções. Outra, bem diferente, é querer que o adversário, no meio da polêmica, perca a capacidade de responder e, por fim, se cale para sempre. Isso é muito cometido pelos políticos inescrupulosos e, como estamos vivendo um momento propício, vamos nos defender ficando por dentro de “Como vencer um debate sem precisar ter razão”.
Depois de ler 6 das 38 arapucas do discurso, baseado no filósofo Arthur Schopenhauer, poderemos talvez perder a ingenuidade de acreditar em tudo, ou em quase tudo, do que nos dizem os grandes oradores, os grandes palestrantes, os grandes debatedores, os grandes políticos ou de todos aqueles que fazem uso da arte da conversação. Mas já estava na hora, né?

Estratagema 01: Encolerizar o adversário.

1. Explicação: Ser injusto, provocar raiva no adversário a fim de não o deixar aproveitar a vantagem.

Para confundir e calar o outro o patife pretende provocar a raiva no interlocutor. Se eu conseguir deixar o meu adversário zangado por algum motivo, devo aproveitar para deixá-lo mais zangado ainda. Digamos que ele seja espírita e eu digo que os espíritas precisam reencarnar dez vezes para conseguir entender um argumento. Se ele ficar irritado, devo continuar a irritá-lo, dizendo, por exemplo, que um espírita que recebe mensagens do além não pode receber os direitos autorais do que escreveu... Ou psicografou, pois suas idéias são emprestadas etc. Se eu conseguir que o meu interlocutor se irrite, conseguirei evitar que pense e fale com clareza.

Estratagema 02: Incompetência irônica.

2. Explicação: Declararmo-nos ironicamente incompetentes de entender a opinião. É melhor quando se tem autoridade. Contra-ataque: Dizer que o assunto é fácil, então foi por falha de explicação ele não entendeu, e explicar de novo.

A coisa pode soar assim: "Olha, meu amigo, a sua argumentação é tão profunda e eu sou tão limitado que não consigo entender o seu pensamento." Dessa forma, estou insinuando que o outro é que é confuso, limitado e incapaz de explicar o que pensa.

Estratagema 03: Discurso incompreensível.

3. Explicação: Assustar e desconcertar o adversário com palavreado sem sentido.

Em sentido inverso ao anterior, é dizer coisas incompreensíveis com ar de profundidade para que o outro se sinta humilhado e, fingindo que compreende, acabe por aceitar tudo o que dissermos. Então, se eu digo: "O paradigma da interação integra o jogo de inúmeras forças concêntricas que, sem privilegiar o efeito, anulam de certo modo a causa. Trata-se, na verdade, de sistemas autogênicos não-ordinários e não-cumulativos que, sem dúvida, exigem uma nova percepção do fenômeno, você concorda?" — poucas pessoas terão coragem de contradizer-me.

Estratagema 04: Rótulo odioso.

4. Explicação: Submeter a afirmação adversária a uma categoria odiosa: Isso é maniqueísmo, isso é nazismo, isso é idealismo, de forma a fazer o público identificar a categoria com a qual já tem preconceito.

Outra possibilidade, bastante difundida nos meios acadêmicos e jornalísticos, é utilizar os chamados "rótulos detestáveis". Em vez de argumentar intelectualmente, procurando o que há de verdade e mentira no discurso alheio, eu posso simplesmente rotular o meu adversário, tirando-lhe o direito de falar: os esquerdistas, ou direitistas, ou arrogantes, ou dogmáticos, ou ateus, ou qualquer outro adjetivo-rótulo pressupõe que o rotulado está proibido, numa sociedade tão democrática como a nossa, de defender suas odiosas idéias. E geralmente o rotulado começa a querer explicar-se e definir-se, dizendo que é ateu por isso e por aquilo, mas que nem por isso é um mau sujeito, ou que não é dogmático embora acredite em dogmas por essas e por outras etc. etc., o que apenas reforça o rótulo e desvia a atenção do que realmente interessava.

Estratagema 05: Negação da teoria na prática.

5. Explicação: Dizer que na prática não vai funcionar. Um dos sofismas preferidos pela mentalidade brasileira é tentar destruir o adversário afirmando que tudo o que ele disse está muito certo... Na teoria, mas que na prática não dá nada certo. Desse modo, desautorizo tudo o que o outro disse porque pressuponho, baseado na observação da vida cotidiana, que, no final, tudo acaba mesmo em pizza, piada e carnaval. O que não deixa de ser, também, uma interessante teoria sobre nós mesmos.

Estratagema 06: Perguntas em ordem alterada.

6. Explicação: Perguntas em ordem diversa a fim de confundir o adversário.

No decorrer da discussão, fazer uma porção de perguntas, um verdadeiro tiroteio que impeça o outro de pensar e responder: "Quanto à linguagem complexa das ciências e sua tradução para linguagem do leigo, eu pergunto: será que o mesmo vale para a microfísica? Para a biologia, por exemplo, será que pode não falar em síntese dos ácidos, mas usar algo mais leigo? Por que o filósofo é sempre acusado de usar uma linguagem estranha ao leigo? Mas a linguagem do leigo é mais simples? A condenação conferida pelo juiz a um réu é efetivada por qual ação? Não é o fato de ele dizer "condenado"? Mas qual ação ele realizou aí? Ele disse algo e, após, bateu com um martelo na mesa. Mas em que momento ele condenou? Ao dizer? Ao bater com o martelo? Ou em ambos? E isto é uma convenção ou não? Pode um juiz dizer 'você está frito' e com isto querer dizer 'condenado'? E se em vez de bater com o martelo ele batesse palmas?" As perguntas podem ser infinitas, e infinitamente irrespondíveis.

Aquele Abraço!

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

SCHOPENHAUER, Arthur. Como vencer um debate sem precisar ter razão: em 38 estratagemas (dialética erística). Introdução, notas e comentários de Olavo de Carvalho. Rio de Janeiro: Topbooks, 1997.

23 de set. de 2008

PARTE VII: Filosofia e Felicidade

Somente a Razão torna a vida alegre e agradável, excluindo todas as Concepções ou Opiniões falsas que podem perturbar a mente.
Epicuro.
Por Neilton Lima, professor e (psico)pedagogo.
Escola de Atenas – Rafael, 1506-1510. Encontra-se no Palácio Apostólico, Vaticano. A Escola de Atenas representa a verdade adquirida através da razão ou celebração da Filosofia. Notem os filósofos Platão e Aristóteles bem ao centro.

Caminhar pelo verdadeiro caminho do pensamento humano livra-nos de dilemas emocionais e neuroses. Uma nova filosofia de vida pode solucionar os problemas afetivos, o temor da morte e os conflitos profissionais, muito melhor que buscar a saída num frasco de antidepressivos. Diluída no dia-a-dia, a filosofia como aconselhamento e discussão vem a ser uma excelente terapia.
O equilíbrio emocional expressa emoções construtivamente, analisa as opções, escolhe e vive com a melhor opção graças à contemplação de uma filosofia. A eficácia da filosofia aplicada ao cotidiano coloca a vida em perspectiva e descarta as crenças inúteis, pois a Ciência e a Religião não dão conta de todas as respostas das quais precisamos.
A vida humana é caracterizada por uma vasta complexidade, em que a maioria leva à infelicidade. O diálogo filosófico é uma fonte para se beber ética, lógica, valores, significado, racionalidade, tomada de decisão em situações de conflito ou risco, conduzindo as pessoas à felicidade num mundo cada vez mais desafiador. Uma vida examinada pela reflexão traz muitos benefícios, inclusive a paz da mente, estabilidade e integridade.
Segundo Lou Marinoff, precisamos pensar criticamente, procurando padrões e reunindo tudo em um grande quadro para seguirmos o nosso caminho na vida. Compreender a nossa filosofia pessoal pode ajudar a evitar, resolver ou administrar muitos problemas. Tudo isso vai nos conduzir à felicidade.
Também somos os nossos próprios filósofos! Se tivermos consciência disso, e por em prática, não absorveremos dogmas nem fraquezas e encontraremos por nós mesmos a verdadeira paz de espírito através da contemplação filosófica, do diálogo e da troca de idéias. Estes vão nos conduzir na direção certa e para os melhores objetivos.

Aquele Abraço!

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

MARINOFF, Lou. Mais Platão, Menos Prozac. – Rio de Janeiro: Record, 2005.

22 de set. de 2008

PARTE VI - Da Definição de Felicidade: “Estar Feliz” e “Ser Feliz”.

Qualquer que seja o propósito último da existência humana, uma coisa é certa: o propósito terreno das pessoas de carne e osso em qualquer lugar do planeta é alcançar a felicidade e fazer o melhor de que são capazes de suas vidas.
Por Neilton Lima*
*Professor, pedagogo e pós-graduando em psicopedagogia.

Não pensem que transcorrer sobre a felicidade seja algo fácil. O termo é vago, escorregadio, relativo, incerto, traiçoeiro... Não dá para ser tão claro e objetivo, no entanto, também não dá para ficar calado sobre o assunto. É preciso refletir e debater, porque “a realidade objetiva não é toda realidade – é apenas parte dela”. E, aliás, a felicidade é uma preocupação universal da humanidade.
Se eu propusesse definir formalmente e por inteiro o termo felicidade, estaria sendo pretensioso e sujeito a contestação e objeções. Mas na linguagem comum se usa muito essa palavra, então vamos pelo menos tentar esclarecer alguns dos significados que a ela se atribui:
1) A felicidade como uma sensação local (estar feliz). Quando algo em particular deixa uma pessoa mais satisfeita do que estava antes. Por exemplo: quando o time pessoal ganha a Copa ou a pessoa consegue um emprego isso lhe traz felicidade;
2) A felicidade como manifestação espontânea de um momento, sem motivos específicos. Alguém simplesmente pode estar sentindo uma sensação de contentamento e bem-estar agora. Nesse sentido, dizemos também que essa pessoa “estar feliz”;
3) A felicidade como satisfação positiva da vida avaliada em seu conjunto. As oportunidades recebidas, as escolhas feitas e as experiências vividas foram mais significativas que negativas. Nesse sentido a felicidade não é apenas uma sensação local (estar feliz), mas um componente reflexivo calcado numa avaliação global da vida (ser feliz).
Logo, estar feliz é uma coisa de momento; e ser feliz é uma dimensão de vida. A pessoa que é feliz tem na vida uma significativa soma de momentos de felicidade. O sentido de felicidade que defendo é o do grau de satisfação global com a vida que se tem – o ser feliz mais que o estar feliz. Uma existência plena, harmoniosa e serena parte da aceitação dos nossos limites pessoais e humanos, a autodisciplina interior e a pacificação dos desejos pela reflexão filosófica e a vida contemplativa.

Ser feliz é ter os pés no chão, mas os olhos mirando as estrelas.

Aquele Abraço!

REFERÊNCIA:

GIANNETTI, Eduardo. Felicidade: diálogos sobre o bem-estar na civilização. – São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

19 de set. de 2008

PARTE IV: A Felicidade como uma Questão Política.

Por Neilton Lima*
*Professor, pedagogo e pós-graduando em Psicopedagogia.

É complicado tratar de política porque historicamente ela apresenta significados diferentes. Porém, de modo geral, é possível entendê-la como luta pelo poder. Política vem de pólis que significa “cidade”. A política é a arte de governar, de gerir o destino da cidade. Desse modo, o político é aquele que atua na vida pública e é investido do poder de imprimir determinado rumo à sociedade.
Durante a Idade Média o poder estava concentrado nos nobres, reis, parlamentos, papas, concílios ou imperadores; na Idade Moderna o poder é centralizado no Estado. Isso significa que é a máquina estatal gerida por um aparato administrativo burocrático quem faz e aplica as leis, recolhe os impostos e tem um exército prontinho para “manter a ordem”. Vale ressaltar que essa ordem só será legítima se houver consentimento daqueles que obedecem.
Assim, nos Estados Teocráticos o poder vem da vontade de Deus; nas Monarquias Hereditárias o poder surge da tradição; nos Governos Aristocráticos parte da eli
te dos ricos e nobres; e, na Democracia, o poder deriva do consenso da vontade do povo.
Quem faz política execre poder sobre alguém porque o influencia pela força física ou ideológica. Logo, o poder é ou está na relação humana. Um exército que obedece ao Estado, por exemplo, exerce poder pela força física. As leis e normas criadas pelo Estado exercem poder sobre os cidadãos pela força ideológica. Só há liberdade onde reina o poder se esse for legítimo e obedecido voluntariamente pelos concidadãos. Do contrário, será algo imposto logo uma tirania.

Visto assim, a felicidade na política é possível se o cidadão for capaz de decidir conjuntamente os destinos da sua cidade. Para isso precisa atuar, debater, votar com consciência e fiscalizar ativamente o plano de governo do seu candidato. Embora nosso sistema político seja o de democracia representativa (somos representados por lideranças políticas, como presidente e prefeitos), não podemos perder de vista a prática da democracia direta. Ou seja, nosso voto é a nossa arma de poder, através dele colocamos e tiramos nossos representantes do poder, a depender do cumprimento fiel e sério das propostas e dos projetos coletivos, nunca particulares.

O voto não morre na urna, permanece no acompanhamento ativo do mandato político por todos nós, prática chamada cidadania. Sendo assim, estaremos praticando e aprendendo a virtude da qual fala Aristóteles: “[...] a finalidade da vida política é o melhor dos fins, e que o principal empenho dessa ciência é fazer com que os cidadãos sejam bons e capazes de nobres ações.” Eu complementaria: Para que os cidadãos construam uma sociedade e uma vida felizes.

Aquele Abraço!


REFERÊNCIAS:

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; & MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. – São Paulo: Moderna, 1993.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Martin Claret: 2003.

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